09 nov 2015

Sistema de integração faz aumentar a produtividade de fazendas do cerrado

* Por José Hamilton Ribeiro / Do Globo Rural

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No fim de novembro, começa em Paris, na França, a COP 21 – Conferência Mundial do Clima. A diminuição do aquecimento global e do efeito estufa são dois dos principais assuntos da reunião.
Dentro da proposta brasileira, existe uma medida considerada revolucionária para a produção agropecuária sustentável: a recuperação de pastos degradados com a tecnologia da integração lavoura-pecuária-floresta. Há 30 anos, o Globo Rural acompanhou os primeiros passos da técnica. Agora, a equipe de reportagem voltou ao cerrado para conferir resultados.

A fazenda em Ipameri, no sudeste de Goiás, é referência da Embrapa no sistema de integração lavoura-pecuária-floresta. Trabalhando num esquema que favorece o meio-ambiente, a propriedade produz soja, milho, boi e eucalipto com uma situação de custos bastante favorável.

Há nove atrás, porém, no local só tinha áreas degradadas e trabalhava no vermelho. Hoje, a área é o cenário ideal para buscar a palavra de ordem do agrônomo João K, que quer as fazendas brasileiras fazendo quatro safras por ano.

“Nós fazemos a safra de verão, que é com soja. Colhemos a soja e fazemos uma safrinha de milho consorciada com capim. Colhemos o milho e colocamos uma safrinha de boi. Tiramos o boi e fazemos uma safra de palhada para o plantio direto e gerar matéria orgânica no solo. Então, são quatro safras dependentes apenas de chuva, sem irrigação”, diz o agrônomo.
O eucalipto também começou a entrar no sistema nos últimos anos e pode render outras safras de madeira.
O agrônomo paranaense, de origem ucraniana, é conhecido pela expressão João K, sobrenome Kluthcouski. Como a palavra é difícil de pronunciar, os colegas de serviço simplificaram só com as iniciais. Mas, para não usar JK, que é nome de presidente, ficou João K. Assim ele é conhecido tanto na Embrapa Arroz e Feijão, onde trabalha, quanto nas fazendas que visita.

O Globo Rural acompanha o trabalho de João K e sua equipe há mais de 30 anos. Em sucessivas reportagens, o programa mostra os trabalhos do agrônomo. Começou no consórcio de arroz com capim. Seguiu para o milho, sorgo, guandu, girassol, soja e outras plantas. A base é sempre semear junto a lavoura e o capim, fazendo rotação de culturas e plantio direto, mexendo na terra o mínimo possível. A tecnologia que está se mostrando revolucionária para climas tropicais.

Na Fazenda Eco Nelore, no município de Teresópolis de Goiás, a 20 quilômetros de Goiânia, o agricultor Robert Berger implantou a integração e traz as contas na ponta do lápis.

“Quando eu assumi a fazenda, há cinco anos, ela estava toda degradada e com uma capacidade animal muito pequena. Eu teria que reformar todos os pastos. Fiz as contas e assustei porque é muito caro. Fui pesquisar e acabei encontrando a integração lavoura pecuária que me falavam que eu reformava o pasto sem custo. Eu falei: ‘uá, como é que eu vou fazer isto?’ Fui visitar uma fazenda, vi os números e resolvi aplicar”, diz Berger.

O agricultor foi abrindo a fazenda por partes. Hoje, Berger ainda tem áreas degradadas, que espera renovar no tempo certo. “É sem custo porque a gente planta o milho, que já tem que adubar. Junto, planta o capim, que eu só pago a semente. Colho o milho, que paga todas as contas e ainda deixa um lucro. A semente eu recupero com a palhada do milho que fica com mais proteína para os animais”, explica.

Na mesma região da fazenda de Robert Berger ainda existe muitas pastagens desfiguradas. Há capim rasterinho no chão e cupim. O mato de folha larga que existia o gado comeu. Só restou um ou outro pé de assa-peixe. Essa é a situação de um pasto degradado.

“Em uma situação dessa o pasto fica tão frágil que sai fácil. Ela não tem fixação da raiz no solo. O próprio ato de pastejo do touro ou do gado arranca com facilidade”, esclarece o técnico agrícola Hélvio dos Santos Abadia.

O avanço do sistema de integração se deve, entre outros fatores, à existência do capim braquiária brisanta. Desde que tenha condição de agir, a braquiária como que afofa o solo para o plantio da lavoura crescer.

Marize Porto Costa, da Fazenda Santa Brígida, em Ipameri, assumiu há nove anos a propriedade com pastagens degradadas. O local lidava só com gado, tinha três funcionários, dois tratores pequenos e uma carretinha. “No início, a gente estava trabalhando até num campo negativo. Pela falta de pasto, uma unidade animal precisava de dois hectares para poder sobreviver. Hoje, nós colocamos quatro”, diz.

O agrônomo Roberto Freitas, que presta consultoria agronômica para diversas fazendas da região, chama atenção para um detalhe do sistema de integração e também mostra-se impressionado com o papel da braquiária e dos restos de cultura na produção de matéria orgânica. “Fazenda funciona 360 dias por ano contemplando a atividade pecuária e a atividade agrícola. Como a gente tem a palhada mais grossa, que o gado não come, essa parte mais fibrosa é que vai dar uma matéria orgânica estável que vai persistir no solo por cerca de 80 a 100 anos”, diz.

Ao longo dos últimos 25 anos, o dia-a-dia da aplicação do sistema lavoura-pecuária foi revelando problemas que precisaram ser contornados. “Na hora de colher o milho, se o milho fosse de espiga baixa, dava embuchamento na colhedeira. Depois, nós criamos técnicas de deixar o capim pequeninho até a colheita do milho, através de pequenas doses de herbicidas. Mas, isso já está evoluído e a grande maioria dos produtores que fazem o sistema já usa essa dose segurando o capim”, diz João K.

2º Bloco da Reportagem de José Hamilton Ribeiro / Do Globo Rural

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26 out 2015

Integrar lavoura e pecuária será questão de sobrevivência, diz estudo

* Por Mauro Zafalon – Folhapress / Folha de São Paulo 

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A agricultura brasileira se destaca entre os padrões globais de desempenho. Os modelos tradicionais de pecuária praticados no país, no entanto, têm um desempenho ainda anêmico.
Dos cerca de 170 milhões de hectares destinados à pecuária extensiva, quase metade encontra-se em algum estágio de deterioração.

A degradação do solo faz com que a ocupação da área seja bem inferior ao potencial das áreas bem conservadas.

A atividade agropecuária exige, no entanto, cada vez mais uma busca por eficiência, que passou a ser uma questão de sobrevivência.

Isso porque há um crescente custo de oportunidade da terra, limites na expansão da área de produção devido à legislação ambiental e exigências de um consumidor mais atento a boas práticas socioambientais.

Avaliando essas questões, Adolfo Fontes, analista do Rabobank de proteína animal, e Renato Rasmussen, do setor de grãos do banco, fizeram um estudo sobre a necessidade e a viabilidade da integração lavoura-pecuária.

A adoção do sistema possibilita recuperação das pastagens, adoção de práticas ambientais sustentáveis, redução de riscos e diversificação da renda do produtor.

A comparação de margens operacionais entre os diversos sistemas de produção aponta uma larga vantagem para o de integração.

Dados do Rabobank apontam que, se o produtor fizer apenas o plantio de soja durante o ano, terá uma margem de R$ 410 por hectare. Se após a soja ele acrescentar a safrinha de milho, essa margem sobe para R$ 604.

Quando a integração envolve a pecuária, o ganho é maior ainda. O plantio de soja, seguido de uma “safrinha de boi”, pode render R$ 743, segundo cálculos do banco.

Durante o cultivo da soja, o produtor mantém também o cultivo de capim, que será consumido pelo boi após a colheita da oleaginosa.

O produtor com solo favorável para a utilização de três safras -soja seguida de milho com capim e, na sequência, o boi- tem margem de R$ 937 por hectare.

ENTRAVES
Rasmussen e Fontes afirmam que a lista de benefícios da integração é animadora, tanto do lado agronômico como do ambiental e econômico, mas essa prática ainda encontra entraves.

É um modelo complexo de produção e, muitas vezes, há despreparo do pecuarista no planejamento e no escalonamento da operação agrícola.

Além disso, há ausência de suporte técnico, o que inibe a expansão. A infraestrutura precária também desfavorece a disseminação dessa técnica, apontam os técnicos.

Apesar disso, Fontes e Rasmussen acreditam que o avanço da integração lavoura-pecuária será promissor nos próximos anos.

Essa expansão será necessária porque cresce a conscientização do consumidor em relação à responsabilidade socioambiental na cadeia produtiva de alimentos.

Há uma maior disponibilidade de recursos financeiros para os que adotam o sistema de integração, apoiado pelo BNDES, via ABC (Programa de Agricultura de baixa Emissão de Carbono).

Além disso, nas propriedades com solos com elevado teor de matéria orgânica, há aumento de produtividade.

Já nas com solo menos estruturados, a integração é uma necessidade devido à retração dos preços de comercialização e das margens dos produtores.

A integração vai permitir, ainda, melhora da produtividade brasileira na pecuária. O Brasil tem um rebanho que corresponde a duas vezes o dos EUA, mas produz menos carne do que os americanos, aponta o estudo do Rabobank.

BENEFÍCIOS
Os técnicos do banco destacam que, entre os benefícios agronômicos da integração lavoura-pecuária, estão o aumento de teor da matéria orgânica no solo, cobertura do solo durante todo o ano, conservação da água e pastagens em períodos de seca.

Entre os benefícios ambientais estão recuperação de pastagens degradadas, redução de emissão de CO2 e aumento de produção de carne sustentável, entre outros.

O estudo destaca, ainda, os benefícios econômicos, que passam por otimização do uso dos recursos da propriedade, mais receita financeira, menor demanda por insumos agrícolas e redução de custos na produção.