27 jul 2016

ILP recupera pastagens em regiões com escassez de água

Por Embrapa Algodão*

article

Recuperar pastagens degradadas mesmo em regiões em que há pouca disponibilidade de água é possível por meio da integração de plantações com a criação animal. Foi o que demonstrou pesquisa realizada pela Embrapa Algodão (PB) na região do Semiárido que testou a integração lavoura-pecuária (ILP). Além de recuperar o campo, os experimentos aumentaram a produtividade de milho ao associá-lo ao plantio de gramíneas as quais comporão a pastagem.

A adoção da prática também mostrou ter forte impacto na preservação da Caatinga. “Hoje o produtor do Semiárido, quando tem uma pastagem degradada, a abandona e vai para outra área porque custa caro recuperar”, observa o coordenador do projeto, João Henrique Zonta, pesquisador da Embrapa Algodão. Essa prática ainda é comum no Brasil, principalmente na região Nordeste, onde a metade dos estabelecimentos agropecuários não utiliza nenhum tipo de prática conservacionista. O resultado são solos degradados e ameaçados de desertificação. Segundo dados do Ministério do Meio Ambiente, 15% da área da Caatinga dá sinais extremos de degradação, são os chamados Núcleos de Desertificação.

Segundo o pesquisador, o cultivo de milho consorciado com gramíneas forrageiras para a ILP é uma alternativa para a recuperação de pastagens e de solos degradados e formação de palhada para o plantio direto (SPD) na região do Agreste, área da região Nordeste localizada na faixa de transição entre a Zona da Mata (litoral) e o Sertão, que se estende pelos estados do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia, com precipitação média anual de 844 mm, porém com constantes e prolongados períodos de estiagem.

Mais safras

“O plantio convencional permite ao produtor do Semiárido obter no máximo uma safra. Nesse sistema, vamos conseguir pelo menos duas: o grão e a matéria verde para o plantio direto ou para alimentar o gado. Assim há um melhor uso da terra, porque em vez de uma safra, teremos duas, com o mesmo recurso e melhor aproveitamento da água da chuva”, compara. “Aqui onde ocorre pouca chuva, quanto mais água você conseguir transformar em massa verde, melhor”, acrescenta.

Além de permitir ao produtor duas safras por ano na região Semiárida, a ILP melhora a fertilidade do solo, pois aumenta a quantidade de matéria orgânica, a infiltração e retenção de água no solo, permite a ciclagem de nutrientes e ainda o protege da erosão. Outro benefício observado pelo pesquisador é que as plantas de cobertura “afofam” o solo para culturas posteriores.

Os experimentos com plantio direto foram instalados em 2010 e com ILP em 2014, na área experimental da Empresa Estadual de Pesquisa Agropecuária da Paraíba (Emepa), no município paraibano de Lagoa Seca. “Nós escolhemos essa área porque ela tinha algumas características típicas do solo do Semiárido como declividade acentuada, problema de erosão, pouquíssima presença de matéria orgânica, solo arenoso, raso, mas uma área que se pode manejar tranquilamente com técnicas de conservação”, relata o pesquisador.

Zonta explica que, para o produtor que já cultiva o milho no sistema convencional, o custo para implementar o sistema requer apenas a compra da semente da gramínea e uma aplicação extra de herbicida. “O saco da braquiária está em torno de R$ 100 e dá para cultivar um hectare”, informa.

A pesquisa mostra quais espécies de gramíneas forrageiras melhor se adaptam ao sistema ILP nas condições do Semiárido e quais são mais adaptadas à formação de palhada para realização do sistema plantio direto de culturas em rotação. Ao longo do estudo, foram observadas as melhorias no perfil do solo, as espécies mais produtivas e mais resistentes ao estresse hídrico. O projeto é financiado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e visa a ampliar a adoção do Plano Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (ABC) na região.

Milho com gramíneas

Foram avaliadas diferentes formas de plantio de gramíneas cultivadas em consórcio com milho, entre elas: capins (buffel, andropogon, urochloa e mombaça) e braquiárias (brizantha cv piatã, decumbens e ruziziensis). Os plantios foram realizados a lanço, na entrelinha do milho e o milho solteiro.

Gráfico com a visão aérea do experimento

6_semiarido_Joao_Henrique
A produtividade de milho para silagem e em grãos não foi prejudicada pelo cultivo em consórcio com as pastagens B. decumbens e B. brizantha cv. Piatã, pois não apresentaram diferenças estatísticas em relação à produtividade do milho solteiro. Os cultivos em consórcio com capins mombaça e urochloa apresentaram menor produtividade se comparados ao milho solteiro, provavelmente devido à competição entre as culturas.

“Apesar das chuvas terem se concentrado somente nos primeiros 60 dias após o plantio, ainda foram alcançados bons rendimentos de milho, tanto para silagem (acima de 30 toneladas por hectare) como em grãos (em torno de 4.200 quilos por hectare) para os cultivos solteiro e em consórcio com B. brizantha cv. Piatã e B. decumbens”, salienta o pesquisador.

A produção média do milho prevista para a Paraíba, segundo dados da Conab na safra 2015/2016, é de apenas 476 quilos por hectare. Além da degradação do solo e da irregularidade das chuvas, outros fatores contribuem para essa baixa produtividade, tais como a não adoção de cultivares produtivas, falta de correção do solo, adubação e o espaçamento inadequado.

Em todos os consórcios houve ganhos de produtividade de massa de forragem. A renda de massa verde (milho + pastagem) foi maior que a produção de massa verde do milho solteiro, com destaque para o consórcio milho + B. brizantha cv. Piatã, que alcançou produtividade média de 60 toneladas por hectare de forragem.

Recomendações de plantio

O pesquisador orienta que o plantio de espécies de gramíneas forrageiras consorciadas com milho deve ser feito a lanço antes do plantio do milho: “Primeiro, deve-se jogar a semente a lanço, depois a semeadora planta o milho. O próprio movimento da semeadora ajuda a enterrar a semente da gramínea e depois a chuva termina o trabalho”.

Ele recomenda o plantio do milho com a braquiária para não perder nenhuma chuva e otimizar o uso do fertilizante. “Isso é fundamental para o sucesso da agricultura no Semiárido porque aqui você não pode perder água de jeito nenhum,” ressalta.

Para reduzir a competição entre as culturas, o produtor pode aplicar uma subdose de herbicida. Ele enfatiza que, se o produtor quer produzir silagem, mesmo competindo um pouco, a produção da gramínea compensa a perda no milho. Se quiser produzir grãos, pode aplicar uma subdose de herbicida (1/5 da dose de nicosulfurom), que não mata a braquiária, mas a enfraquece um pouco e ela não compete com o milho no início, de acordo com o especialista que afirma que depois que o milho cresce, não ocorre mais competição.

As espécies Brachiaria brizantha cv. Piatã e Brachiaria decumbens foram as que menos prejudicaram a produtividade do milho e são as mais indicadas para o Agreste. “A braquiária piatã é bem resistente ao estresse hídrico. Nós tivemos 150 dias sem chuva e ela resistiu bem e ainda conseguiu produzir. Daí a importância da integração: se faltar água na época do enchimento de grãos e comprometer a produtividade do milho, a forragem ainda é viável. Se tivesse plantado só milho poderia ser perda total.”

Os próximos passos do projeto são inserir o sistema nas áreas de produtores do Agreste e identificar espécies de gramíneas forrageiras que melhor se adaptem ao Sertão, onde a disponibilidade de água é ainda menor.

Válido para todo o Brasil

O Plano ABC tem a finalidade de responder aos compromissos assumidos pelo País quanto à redução de emissão de gases de efeito estufa no setor agropecuário por meio da recuperação de pastagens degradadas, da Integração Lavoura-Pecuária (ILP) e do Sistema Plantio Direto. A meta é aumentar a adoção do Sistema ILP em quatro milhões de hectares e do sistema de plantio direto (SPD) em oito milhões de hectares em todo o País, evitando que entre 18 e 22 milhões de toneladas de CO2 equivalente (que são todos os gases de efeito estufa produzidos na atividade medidos em comparação aos efeitos do gás carbônico) sejam liberadas.

O coordenador de manejo sustentável dos sistemas produtivos do Mapa, Elvison Nunes Ramos, enfatiza que o sistema ILPF é válido para todo o Brasil, mas requer geração conhecimento para ser adaptado às diferentes regiões. “É preciso ampliar o conhecimento e as opções para o Semiárido porque o clima é bem específico e determina as culturas que deverão ser adotadas e as possibilidades de rotação. É um trabalho de pesquisa local para conhecer o que se pode utilizar para essa região”, afirma.

 


19 jul 2016

Sistemas ILPF são mais lucrativos que culturas solteiras

Embrapa Agrossilvipastoril *

article

O retorno do investimento feito pelos produtores que adotam sistemas integrados de produção como a integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) é maior do que daqueles que utilizam sistemas exclusivos de lavoura ou pecuária. O resultado foi identificado na Embrapa Agrossilvipastoril por meio da avaliação de quatro Unidades de Referência Tecnológica e Econômica (URTE) em Mato Grosso.

Na fazenda Dona Isabina, em Santa Carmem (MT), por exemplo, no período de 2005 a 2012, para cada um real investido pelo proprietário no sistema integrado, o lucro foi de R$ 0,53. Já a fazenda modal da região, com agricultura exclusiva, neste mesmo período teve um prejuízo de R$ 0,31 por real investido. O lucro anual de cada hectare na ILPF foi de R$ 230, muito superior ao prejuízo anual médio de R$ 116 da sucessão soja e milho.

Trabalhando com ILPF, a Fazenda Brasil, em Barra do Garças (MT), também obteve resultados superiores à fazenda modal da região, com retorno de R$ 0,89 por real investido contra R$ 0,35 registrados na propriedade de comparação.

O pesquisador da Embrapa Agrossilvipastoril Júlio César dos Reis explica que cada caso é particular, pois são muitos os fatores que influenciam nos custos e receitas. Como exemplo ele cita a localização da propriedade, logística, tipo de sistema integrado, culturas adotadas, época de avaliação, câmbio, entre outros.

Júlio César explica que no caso da Dona Isabina, um fator que contribuiu muito para os resultados tão superiores da integração lavoura-pecuária foi o mau momento vivido pela agricultura nos anos 2005 e 2006. Fatores como a ferrugem asiática aumentaram o custo de produção num período em que o preço da soja estava baixo e o milho safrinha ainda era pouco expressivo. Logo, a pecuária do sistema integrado ajudou a equilibrar as contas. Isso mostra como a diversificação das fontes de renda no sistema integrado contribui para a maior segurança do produtor.

A comprovação da importância da conjuntura para o resultado final está nos dados obtidos na fazenda Certeza, em Querência, no leste do estado. A propriedade também trabalha com integração lavoura-pecuária e teve os resultados econômicos de 2008 a 2012 analisados. Naquele período, o mercado da soja já havia se recuperado, sobretudo com o estabelecimento da China como grande compradora do grão. Com isso, a fazenda modal de agricultura obteve resultados melhores do que a ILP. Mesmo assim, o sistema integrado ainda se mostrou viável.

De acordo com Júlio, os dados avaliados mostram que a ILPF tem todas as condições de ser lucrativa, mas também reforçam a necessidade de planejamento e organização para tomar as decisões mais corretas no momento certo.

“Olhando nossos resultados é bem evidente que vale a pena adotar a ILPF. Mas é preciso ter muito claro que é um sistema que só apresenta resultados se o produtor tiver um nível de planejamento e organização muito grande. Se por um lado o sistema mostra um nível de retorno, receita e comportamento mais estável no tempo, isso é em função do desempenho do produtor. Saber negociar no momento correto e entender as dinâmicas dos preços são questões fundamentais”, analisa o pesquisador da Embrapa.

Indicadores de rentabilidade

Mesmo levando-se em consideração todas as características de cada fazenda avaliada, todas as propriedades com alguma configuração de ILPF tiveram resultados positivos. A maior parte delas, inclusive, superando com grande margem as áreas modais com as quais foram comparadas.

Para que seja possível comparar resultados de fazendas tão distintas, a equipe do projeto, composta por pesquisadores da Embrapa, professores e alunos da Universidade do Estado do Mato Grosso (Unemat), analistas do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea) e da Rede de Fomento ILPF, padronizou uma metodologia de análise de custos. Com esse método, é possível chegar a indicadores que auxiliam o produtor a visualizar os benefícios econômicos da ILPF.

Três desses indicadores exemplificam bem os resultados. Um é o valor presente líquido anual (VPLA), que faz uma comparação do fluxo de custos e receitas ao longo do tempo, traz os valores para o momento inicial do sistema e mostra a rentabilidade por ano. Outro indicador é o índice de lucratividade, que apresenta o lucro ou prejuízo para cada R$ 1 investido. O terceiro indicador é o retorno sobre investimento anualizado (ROIA), que é uma transformação percentual do índice de lucratividade.

A análise econômica da ILPF ainda gera outros índices que estão sendo trabalhados para que possam auxiliar tanto os produtores na tomada de decisão quanto os agentes financiadores a simularem melhor os sistemas integrados no momento de liberar o crédito. “O produtor precisa estar sempre muito conectado com o que está acontecendo para tomar a decisão correta. Nossas avaliações tem o intuito de dar dicas para ele de como as coisas estão se comportando”, afirma Júlio César dos Reis.

Casos

Até o momento, quatro URTEs já tiveram a avaliação econômica de todo o ciclo fechado. Nos casos das fazendas Dona Isabina e Certeza o ciclo já se encerrou e os dados utilizados são todos reais. Já nas fazendas Gamada, em Nova Canaã do Norte, e Brasil, em Barra do Garças, como há florestas plantadas no sistema que ainda não foram cortadas e vendidas, os valores utilizados referem-se a simulações de mercado.

A fazenda Dona Isabina foi aquela que apresentou a maior diferença favorável ao sistema de integração lavoura-pecuária. A ILPF foi o que manteve as contas positivas no período de 2005 a 2012.

1-ILPFrendimentos

A propriedade Certeza, em Querência, foi a única em que os resultados da fazenda modal foram superiores aos da integração. O resultado foi influenciado pelos baixos preços obtidos com a venda do gado na região. Mesmo assim, a ILPF ainda se mostrou viável.

2-ILPFrendimentos Na fazenda Brasil, em Barra do Garças, a pecuária e a madeira do eucalipto plantado em renques de linhas triplas elevaram o lucro do produtor e diversificaram as fontes de receita.
3-ILPFrendimentos
Já no caso da fazenda Gamada, em Nova Canaã do Norte, os números também são positivos, indicando boa rentabilidade da ILPF ao produtor. Porém, a analista da Rede de Fomento ILPF, Mariana Takahashi explica que não foi possível fazer um comparativo devido à inexistência de uma fazenda modal de pecuária em 2008, quando a avaliação começou a ser feita.

Mariana explica que a comparação só seria possível sabendo-se os custos e receitas de uma fazenda daquela época. A equipe do projeto tem buscado estas informações, porém até o momento não obteve êxito em conseguir dados precisos e completos.

4-ILPFrendimentosPesquisa

A pesquisa de avaliação econômica de ILPF é coordenada pela Embrapa Agrossilvipastoril e conta com parceria com o Imea, Unemat, Rede de Fomento ILPF e com participação de outras Unidades da Embrapa.

Por meio de um projeto nacional, a metodologia de avaliação quem vem sendo validada em Mato Grosso será aplicada em outros estados, padronizando os trabalhos na área de economia em ILPF.


18 jul 2016

Fazendeiro de Rondônia é exemplo por produzir preservando a natureza

Globo Rural*

ILPF

Uma fazenda na Amazônia, que é bom exemplo de lavoura, pecuária e floresta. E com certificado de excelência por suas práticas sociais, ambientais e econômicas.

O tipo do lugar onde quase todo mundo se conhece. Machadinho d`Oeste tem pouco mais de 30 mil habitantes. E se há alguém que todo mundo conhece, é o dono da ‘Farmácia do Gil’. Gil é o apelido de Giocondo Valle. Farmacêutico diplomado e bastante procurado. “No interior do Brasil, a farmácia é o grande portal do cidadão para o sistema de saúde”.

Famoso como farmacêutico e também como fazendeiro. O Globo Rural foi até a propriedade dele, a Fazenda Dom Aro, para conhecer sua segunda ocupação. O nome da fazenda é uma homenagem do dono ao pai dele. Dom Aro é o apelido do seu Aristides, um pequeno agricultor e pecuarista, ainda em atividade, lá no Paraná, aos 80 anos. Já o certificado que a fazenda ganhou, de boas práticas agrícolas, é um outro tipo de homenagem, um reconhecimento ao trabalho que se faz lá.

Classificado na categoria ouro pela Embrapa, o Gil foi pioneiro na região. O município de Machadinho tem 28 anos. Ele chegou há 30. E boa parte do que Gil pratica, ele trouxe de Quatiguá, no norte paranaense. Tradição familiar. “O meu nonno, pai do meu pai, ele era um ambientalista analfabeto, mas um ambientalista sem tamanho. Tinha um respeito. Principalmente pelos leitos de água”.

Dos 1.600 hectares da fazenda, 45% são de floresta, isolados dos terrenos abertos. São áreas de proteção permanente, com mata totalmente preservada ou em recuperação, e vários trechos de reflorestamento. Um dos primeiros, foi plantado há quase 20 anos. São 12 mil árvores de teca, de origem asiática. Madeira muito valiosa, que poderá ser aproveitada em mais uns 10 anos. Também estão plantadas algumas castanheiras nativas. Gil fala sobre uma delas: “Uma árvore grande, pra 18 anos. Um diâmetro de mais ou menos 60 centímetros, uma altura, aproximadamente de 18 a 20 metros, e algo como cinco anos em produção”.

A produção de castanha, para valer, vai demorar um pouco. O Gil plantou mais 12 mil árvores, em outra área, há oito anos. Entre elas, como em todos os reflorescimentos, a brotação de espécies nativas, amazônicas, é estimulada. Mas como tudo isso era encarado, tempos atrás? “Diziam que era uma coisa de doido, que eu tava pegando dinheiro bão e jogando fora. E com o seguinte argumento: viemos aqui pra selva amazônica com a proposta e a solicitação de derrubar e produzir e você vai plantar?”.

Mas o Gil foi em frente, tocando a pecuária nas áreas abertas. Recuperando pastos degradados, plantando novos. E produzindo, para sustentar a propriedade: “Sem dinheiro, a propriedade vai ficar linda, maravilhosa, endividada e o vizinho vai comprar ela. Também não resolve nada”.

O Gil conta que a certificação da Embrapa, em 2014, abriu as portas dos bancos públicos para a obtenção de financiamentos. Mas que antes disso, trabalhou com recursos próprios, inclusive da farmácia. E não foi pouco investimento para a melhoria dos pastos. Limpeza e regularização dos terrenos, calagem, adubação. Sementes de qualidade. O resultado: dois bois por hectare, que antes só engordava meio boi. “Mas nós temos todo um projeto pra chegarmos a pelo menos três animais por hectare, o ano todo, com leve suplemento no cocho”.

A fazenda pratica o ciclo completo: cria, recria e engorda. Vacas nelore, bezerros com meio sangue aberdeen. Esses, deste lote, vão ser desmamados com oito meses, e peso acima de oito arrobas. A busca por qualidade, passa por precocidade.

Responsável pelas inseminações, pelo melhoramento genético, o Eanes diz que a vantagem econômica é concreta: “Enquanto aqui na nossa região, vende um bezerro desmamado de seis arrobas, na média de R$ 900 até R$ 1.000, um bezerro daquele é praticado aqui de R$ 1.300 até R$ 1.400”.

Junto com o Eanes trabalha o Hassan, veterinário. Ele verifica a prenhez de um lote de novilhas, também precoces: “Elas receberam a primeira inseminação com 17 meses. No Brasil, a média dos animais emprenharem é 24 meses. E a gente vê, em algumas propriedades, emprenhando com 30 meses, ou seja, dois anos e meio. Encurtamos praticamente um ciclo”, conclui Eanes.

O tempo médio de engorda, só a pasto, foi reduzido, de três para dois anos. “Eu já posso iniciar uma nova safra naquela pastagem que estaria ocupada com aquele animal que ia ficar ali 36 meses, ele tá saindo com 24, então a gente já está ganhando dinheiro nisso daí”, afirma Eanes.

Isso sem falar na qualidade de um animal mais jovem: “Mesmo que a gente não tenha uma retribuição financeira desejada, porque o mercado aqui em Rondônia ainda não tá pagando por qualidade, mas aí é questão de fornecer pro mercado uma carne de boa qualidade”, diz o veterinário Hassan Oliveira Kassab.

Detalhe importante: tudo isso sem truques, garante o veterinário: “Hormônio nunca foi usado na propriedade e todo medicamento que é feito nos animais, no dia do manejo no curral, é anotado o número do animal e o histórico de medicamento. A gente respeita a carência de vermífugo, uso de vermífugo de longa ação só pra categoria que não vai ser abatida”.

Gil explica o porquê do cuidado: “Para que, quando o animal seja abatido, ele tenha resíduo zero de hormônios, de vermífugos ou de produtos dessa natureza em sua carcaça”.

O processo de certificação exigiu mudanças no curral, para aumentar a segurança de quem trabalha e o bem-estar dos animais. O manejo também foi alterado: nada de ferrão. “A gente observa, que os animais ficaram mais dóceis, sem pancadaria, sem maus tratos, só com bandeira, sem gritaria. O manejo ficou mais fácil, mas pra chegar a esse manejo, a gente teve que adaptar algumas estruturas do curral”, conta Hassan.

A parte da agricultura, a terceira do tripé proposto na fazenda, caminha para o seu estágio ideal, de produção de grãos. Uma área de pastagem degradada, foi toda regularizada, recuperada. Recebeu dois plantios de arroz, cultura pioneira, que aceita um solo mais bruto, e agora as máquinas estão preparando a terra para o primeiro plantio de soja.

E será uma área multiuso, em rotação com capim braquiária, explica o especialista da Embrapa, Vicente Godinho: “Ele pode plantar o capim sobre a soja, antes de colher a soja ou pode tirar a soja e plantar o capim. Quando joga junto, a gente chama de sobre-semeadura. Você pode usar o boi ali, três, quatro meses, só. A produção de massa naquele período é tão intensa, que tem gente confinando boi a pasto. Quando chega setembro, outubro, ele desseca e planta a soja em cima”.

Segundo ele, o capim se beneficia do solo corrigido física e quimicamente para a soja. Gosta da adubação: “Hoje pasto não é mais pasto. É uma cultura como outra qualquer”. E o capim retribui. Recobre o solo, retém humidade. E como tem raízes mais profundas… “Ele busca nutrientes que estavam fora do horizonte de exploração da soja e jogam aqui pra cima. Aquele nutriente fica acessível à soja. Um ajuda o outro”.

E a produção bem sucedida ajuda a manter outro dos três ítens analisados na certificação da Embrapa: o ambiental. Nesse tópico, a fazenda Dom Aro tem até programa de gerenciamento de resíduos sólidos registrado. Controle rigoroso sobre embalagens de agrotóxicos, armazenamento de combustíveis, sobras de lubrificantes, tudo que se recolhe nos diferentes ambientes vai para aterros sanitários de Machadinho ou de Vilhena, a 600 Km da propriedade. Ou até mesmo para reciclagem, em Cuiabá.

“Aqui não fica. É proibido. Aqui é lixo zero. E é lixo zero materializado no seu dia-a-dia. Isso tudo dá trabalho, bastante, e uma despesa razoável. Só que nós temos isso como um princípio de produção agorpecuária”, afirma Gil.
E as práticas ambientais acabam ajudando no terceiro ítem exigido pela embrapa: o cuidado social. Cercadas de árvores, as residências tem o clima mais agradável, no meio do calor forte da região. E as boas condições das moradias também contam pontos.

Os trabalhadores são registrados, tem todos os direitos. Até mais do que isso, conta Gil: “Tem férias de 40 dias por ano. Tem décimo terceiro e, no mínimo, décimo quarto. Mas eu eu já cheguei a pagar 16 salários e meio num ano aqui dentro da propriedade”.

Um dos funcionários, Atônio Teles Júnior, tem 28 anos e comanda a pecuária, no campo. Passou metade da vida trabalhando em fazendas. Chegou à Dom Aro há um ano e meio, mas quase não foi. “Todo mundo comentava que o Gil era enjoado, gostava das coisas limpas, organização, entendeu? Acostumado com os trem de qualquer jeito, aí o pessoal falava isso aí. Até eu fiquei com medo”. Mas ele acabou gostando da organização: “Funciona, muito melhor do que se for bagunçado. É mais fácil. Vida organizada é mais fácil do que bagunçada”. E faz mais um elogio ao estilo do Gil: “Ele quer que você seja igual a ele, entendeu? Ele não quer obrigar. O conhecimento que ele tem, ele quer que você saiba. Através de reunião, palestra, livro, tenho muito livro, ali, que ele traz, revista”.

“Eu não sei tudo, e nunca saberei tudo. E não tenho o menor problema em admitir que não sei determinadas coisas. Mas tenho uma curiosidade enorme. Então eu me cerco de pessoas que são muito melhores do que eu”, diz Gil.
E a equipe é mesmo unida, entrosada nas ideias da sustentabilidade: “A filosofia que o Gil implantou, e que a gente também é seguidora dela, é de cada dia melhorar mais, e a gente usar essa terra que tem aqui, esse capim, e deixar para as outras gerações, também que vem. Não só a gente poder usufruir dela, mas deixar pra filhos, pros netos.

Porque, será que só nós temos direito de chegar aqui e utilizar, retirar tudo que ela tem de potencial? E os outros? Os outros também vão poder usufruir dela”, analisa Eanes.

Segundo o seu Gil, a produção de grãos e principalmente a pecuária dão um bom lucro. Já as árvores, são uma espécie de poupança, que vai render no futuro. Além disso, essas iniciativas valorizam a fazenda, que se mantém em sintonia com mercados, cada vez mais preocupados com as condições de produção no campo.


12 jul 2016

Canal do Produtor TV recebe o representante da FAO no Brasil

*Do SENAR Brasil

alan_bonjanic

O Canal do Produtor TV recebeu o representante da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) no Brasil, Alan Bojanic, para falar sobre o Projeto de Recuperação de Áreas Degradadas na Amazônia (PRADAM).

No quadro SENAR Brasil Entrevista, ele contou que a capilaridade do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR) e a técnica de ensinar conteúdos complexos de maneira efetiva foram determinantes para a cooperação.

Assista à entrevista na íntegra

Para visualizar a agenda de eventos do PRADAM, acesse: http://www.senar.org.br/abcsenar/pradam/

 


08 jul 2016

Série de seminários sobre o PRADAM começa pelo Pará

*Do SENAR Brasil

Abre

 

Os princípios e tecnologias de produção sustentável no bioma amazônico preconizadas pelo Projeto de Recuperação de Áreas Degradadas na Amazônia (PRADAM) – parceria entre o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR Brasil), a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e a Embrapa – começaram a ser apresentadas para produtores, técnicos e estudantes nesta quarta-feira (6/7).

O primeiro seminário de sensibilização do projeto reuniu, aproximadamente, 200 pessoas, na sede do Sindicato dos Produtores Rurais de Marabá. Representantes do SENAR, da Federação da Agricultura e Pecuária do Pará (FAEPA) e do Mapa falaram sobre as quatro tecnologias oferecidas pelo PRADAM: Recuperação de Pastagens Degradadas, Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (iLPF), Sistema Plantio Direto (SPD), Florestas Plantadas e Sistemas Agroflorestais (SAFs).

Carlos Xavier

Para o presidente da FAEPA, Carlos Xavier, o bioma amazônico vem sendo explorado nas últimas décadas, mas outras iniciativas do Sistema CNA/SENAR, como o Projeto Biomas, já demonstraram que a região pode servir de vitrine tecnológica para o desenvolvimento de atividades agrícolas com retorno econômico. Ele ressalta que a pecuária é a principal atividade dentro do agronegócio do Pará e que o PRADAM vai contribuir para que se possa fazer recuperação de áreas degradadas e aumentar a capacidade de animais nas pastagens. “Em qualquer atividade econômica você precisa agregar tecnologia e vamos aprender a fazer isso aqui, inclusive para dar resultado para o nosso País. Não tenho dúvidas de que teremos resultados altamente satisfatórios”.

Walter Cardoso

Na opinião do superintendente do SENAR-PA, Walter Cardoso, o PRADAM contribuirá de uma maneira efetiva para correções de situação referentes à proteção do ecossistema e para que os produtores obtenham uma melhor “performance” na sua atividade. “O projeto está exatamente condizente com a proposta do SENAR no estado do Pará e do SENAR Nacional. A nossa grande preocupação, como um todo, é levar aos produtores e trabalhadores rurais os bons ensinamentos para que eles possam desenvolver com sucesso o seu empreendimento agropecuário. Todo projeto que possa realmente contribuir para que o produtor rural tenha um melhor retorno econômico e social não só para si, mas como para a sua família também, nós apoiamos e vestimos a camisa”. Ele também entende que o PRADAM vai contribuir perante as cobranças dos órgãos governamentais, especialmente no que diz respeito às reservas florestais, áreas de conservação permanente, ao Cadastro Ambiental Rural (CAR) e ao Licenciamento Ambiental Rural (LAR).

Durante o seminário, os participantes também puderam aprender ainda mais sobre as práticas do projeto em duas palestras ministradas por pesquisadores da Embrapa Amazônia Oriental. “Sistemas agroflorestais: alternativa à diversificação, segurança alimentar e conservação dos recursos naturais” foi o tema abordado por Débora Veiga de Aragão. Já Moacyr Dias Filho falou sobre recuperação de pastagens e iLPF.

Matheus Ferreira

O coordenador nacional de Assistência Técnica e Gerencial (ATeG) do SENAR, Matheus Ferreira, observa que além de disseminar os conceitos das tecnologias de uma forma “aplicável” para os participantes, os seminários têm a finalidade de acabar com a resistência que às vezes existe em relação a esse tipo de práticas e mostrar que elas são viáveis, rentáveis e trazem grandes benefícios para quem as utiliza. Ferreira observa, ainda, que o PRADAM tem outra função relevante: desmistificar a ideia de que a exploração agropecuária na Amazônia desmata e promove o trabalho escravo “Quando se fala em região amazônica como um todo, existe um grande interesse de todos os países do mundo. O que PRADAM também quer mostrar é que existem formas sustentáveis de se produzir sem degradar o meio ambiente e que as áreas estão sendo preservadas, respeitando a legislação e, sobretudo, com ganho para o produtor rural”.

Além dos eventos de sensibilização que acontecerão nos outros estados integrantes da iniciativa (Acre, Amazonas, Mato Grosso, Maranhão e Rondônia), está sendo organizada uma turma de capacitação com 60 técnicos de ATeG (10 de cada estado participante). O primeiro módulo do treinamento vai ocorrer no dia 11 de julho, na Embrapa Agrossilvipastoril, em Sinop (MT). Com carga horária de 180 horas/aula, a programação prevê conteúdo tecnológico, metodológico e gerencial.

Evento reuniu centenas de pessoas em Marabá

Muitos benefícios com o PRADAM

Josenir Nascimento

O superintendente do Mapa no Pará, Josenir Nascimento, salienta que “cultura de recuperação de áreas degradadas” já é muito forte no Sul e Sudeste e é extremamente importante que o PRADAM traga isso para a região da Amazônia. “O maior patrimônio que é um produtor tem é a sua terra. Quando ele desenvolve um trabalho tecnificado para recuperar as suas áreas, ele está recuperando o seu patrimônio e isso é extremamente importante porque vai gerar mais renda e dar mais qualidade de vida para o produtor”. Outra vantagem que Nascimento enxerga no projeto é atender a uma demanda do mercado internacional, que prefere comprar de áreas certificadas e de origem, onde são conhecidas as práticas ambientais que os produtores utilizam.

Fábio Alves

Fábio Henrique Alves, que atua com técnico no SENAR-PA há mais de 15 anos, avalia que o principal benefício do PRADAM será a recomposição florestal e o alinhamento com as novas tecnologias de baixa emissão de carbono que são preconizadas pelo mundo. Segundo ele, o projeto poderá trazer vantagens tanto para grandes e médios produtores, através da recuperação de pastagens degradadas e do plantio de florestas plantadas, como para pequenos, que por meio da associação com serviços agroflorestais poderão obter uma fonte de renda extra durante todo o ano. Alves alerta que o principal desafio será promover uma mudança de paradigma em relação a uma cultura antiga que ainda existe na região que é a “derruba, queima e planta”. “Estamos trabalhando com algo que é meio ingrato que é a transferência por inveja. Nós vamos numa propriedade, aconselhamos um produtor que tenha um pouco mais de flexibilização, fazemos um trabalho lá e depois de dois ou três anos, quando esse produtor começa a ter retorno, a gente chama os outros pra mostrar que dá certo. Um produtor com outro produtor se entende melhor do que a gente ficar só falando de técnicas”.

Maurício Filho

O produtor rural e diretor do Sindicato dos Produtores Rurais de Marabá, Maurício Fraga Filho, conta que quando a sua família chegou na região vinda de São Paulo, em 1973, era comum abrir áreas e “derrubar mato” para a pecuária. Mas agora isso mudou. Na opinião dele, o PRADAM, além de recuperar áreas degradadas e torná-las mais produtivas, terá o importante papel de evitar com que novas terras se degradem, o que vai estimular ainda mais o potencial produtivo da pecuária na região, que tem ótimas condições climáticas para a atividade o ano todo. “Tanto como pecuarista como diretor do sindicato, nós temos um interesse muito grande nesse projeto, mas o desafio sempre é financiamento. Precisamos de dinheiro para desenvolver esse projeto e reformar pastos. Cada vez os bancos exigem mais documento e isso dificulta um pouco o acesso ao crédito. Dinheiro tem, mas a dificuldade burocrática é o maior problema para a gente hoje”, afirma ele, que trabalha com recria e engorda de gado na região de Marabá.